Histórias de uma portuga em movimento.
31
Ago 04
publicado por parislasvegas, às 02:29link do post | comentar


Calcula-se que Pequim tenha cerca de 14 milhões de habitantes, embora oficialmente conte "apenas" com 9. Na minha primeira viagem ia cheia de pré-conceitos sobre a cidade e os seus habitantes. Às vezes não ajuda ler os guias turísticos todos que se apanham à mão. Há alguns que são irrealistas (é tudo muito bonito, as pessoas são óptimas, etc) e outros que são quase xenófobos (os chineses são altamente hostis para estrangeiros, controladores, antipáticos e o diabo-a-sete). Como sempre, a verdade está no meio-termo.
A cidade é bastante movimentada e tem um trânsito de automóveis e bicicletas completamente caótico. Os sinais de trânsito são moderadamente respeitados pelos automobilistas e ostensivamente ignorados pelos ciclitas. É preciso muito cuidado quando se conduz para não atropelar uma bicicleta ou um peão (aqui o estrangeiro é sempre culpado, independentemente da culpa real no acidente e as consequências podem ser bastante pesadas) e igualmente cuidados redobrados quando se anda a pé para não se ser atropelado por um ciclista (a coisa do estrangeiro tem sempre a culpa é válida igualmente se este for a vítima de um atropelamento).
Quanto a multidões a circular na rua, não se nota muito o peso demográfico devido à escala da cidade que é absolutamente inumana. As avenidas são tão grandes que às vezes quando se anda no passeio da esquerda, quase não se conseguem distinguir os edifícios que ficam no passeio da direita.
Assim descrita podem pensar que Pequim é um sítio horrível. Para quê passar férias numa grande metrópole poluída e stressante?
Para já, Pequim não tem stress. As pessoas movimentam-se e vão resolutamente às suas vidas. Mas sem pressa.
E depois é uma cidade com pequenos oásis de tranquilidade, escondidos em cantos quase impossíveis de descobrir (daí a utilidade dos guias...). Jardins orientais e bairros tradicionais onde as ruas são à nossa escala, tudo isso tem uma atmosfera imbatível que compensa em muito a confusão da grande cidade.
É apenas uma questão de passear com tempo no meio do barulho e agitação e demorar os olhos em pequenos pormenores: um parque público onde os idosos se exercitam calmamente nos aparelhómetros de ginásio, sessões públicas de tango numa praça da cidade, papagaios lançados ao vento em Tianamen por gente de todas as idades, um jogo de cartas animado improvisado à beira da estrada. E à noite, nas noites quentes e húmidas de Outono, bairros inteiros saem à rua e os vizinhos conversam e passeiam os seus pequenos cães "pequinoise".
Como em muita coisa na vida, o nosso amor por um sítio, um modo de vida, uma cultura, chamem-lhe o que quizerem - está na nossa forma de olhar.

30
Ago 04
publicado por parislasvegas, às 01:23link do post | comentar


E cá estou eu. "Back in the USSR", com uma pedrada descomunal à conta da diferença horária e do cansaço que foi viajar de Pequim para Moscovo e daí para casa, numa maratona de 18 horas com duas crianças pequenas.
A conclusão imediata é que eu não devo regular bem da cabeça. Mas acreditem que valeu a pena o sacrifício. Aquelas duas semanas em Pequim foram excelentes para nós adultos e uma aventura exótica para as crianças. O pior mesmo foi o regresso.
Já não ia a Moscovo desde 1999, o aeroporto pouco melhorou, já a cidade não faço ideia, porque apesar de ter os documentos todos em ordem, com vistos que nos permitiam sair do aeroporto e circular pela cidade, fomos "presos" durante seis horas, impedidos de sair do perímetro de uma salinha miníscula e durante cerca de duas horas nem direito a ir à casa de banho....
Foi preciso armar escândalo para conseguirmos por os miúdos a fazer um xixi. Isto depois de 8 horas no ar e com o cansaço de 5 horas de diferença horária. A propósito: se algum dia vos disserem que a Federação Russa é uma grande potência e um país muito desenvolvido, não acreditem. Os gajos são cheios de tretas.
Fomos depositados no avião de regresso a casa (mais duas horas) por um autocarro que já devia estar na sucata há mais de 10 anos. Assim que o nosso tupolev levantou voo, os três desgraçados que iam à minha frente levaram com o painel do oxigénio em cheio na tola e ainda foram mal tratados pelas hospedeiras que se irritaram valentemente com o facto de os passageiros terem visto que o avião se estava a desfazer em pleno voo.
Depois deste tratamento VIP na Rússia ficámos aliviados quando chegámos a casa. Esta terra não é assim tão má. Pelo menos pode-se apanhar um taxi no aeroporto e ter a certeza que se chega vivo e com a bagagem toda a casa, coisa que em Moscovo não é assim tão evidente.
Este post não deve estar lá a fazer muito sentido, nada na minha cabeça está a fazer lá muito sentido. Principalmente porque não consigo encontrar razões válidas para ter regressado a "casa". Estava tão bem no meu apartamentozinho em Pequim, já tinha o "meu" supermercado e a "minha" barraquinha de fruta, os vizinhos do bairro a tentarem fazer conversa. O chinês é infinitamente mais difícil do que o russo, mas em duas semanas eu já conseguia balbuciar o suficiente para me conseguir orientar sozinha em tarefas do dia a dia. Tudo acaba por ser mais fácil do que aqui. Pela simples razão que toda a gente trabalha (tranquilamente, mas trabalham). Aqui, mesmo pagando o dobro dos preços que se praticam na União Europeia, não há ideia da relação qualidade-preço ou de um serviço eficiente quando é bem pago. Não há noção do que é o capitalismo. Já os chineses nunca perderão essa noção. Nos anos mais duros do maoismo, muitos chineses arriscavam o pescoço para negociarem no mercado negro. Num dos livros que li sobre o assunto, um analista político chinês comentava que tirar o comércio ao seu povo era retirar-lhes uma das únicas habilidades "genéticas" que tinham. A doutrina "um país, dois sistemas" está longe de ser perfeita e ideial, mas pelo menos permite o desenvolvimento de alguma livre iniciativa - de alguma forma o governo tem que permitir que aquela gente toda ganhe o seu sustento e se alimente. Resta saber o que os chineses vão fazer agora que já têm uma classe alta e uma classe média. Sempre quero ver como é que um Estado comunista se desembaraça teoricamente para justificar o incentivo à criação de diferentes classes sociais.
Bom, como eu dizia, este post está mesmo a viajar na maionese. É melhor parar por aqui antes que eu adormeça em cima do teclado.

12
Ago 04
publicado por parislasvegas, às 05:50link do post | comentar
Falta um dia e meio para entrar de férias, e como já vem sendo habitual, a minha vida entrou em loop invertido acompanhado de flick flack à retaguarda.
Isto já é mais ou menos habitual, e acho que acontece a toda a gente entrar em stress com as trinta mil coisas que se têm que ser preparadas antes de sair de férias. Mas este ano o destino ou o fado ou o raio que o parta anda mesmo a gozar comigo.
Primeiro apanhei um susto do caraças com um problema de útero (não pode mesmo haver castigo mais severo - à conta de uma maçã!!!!uma mísera maçã, porra!!!!!) que ainda não me passou. O tratamento é lindo - uma espécie de brincadeira com as hormonas a ver se me passo de vez da moleira ou se me aguento à bronca sem morder em ninguém.
Sinceramente, os meus SPM's são tramados, mas nunca tinha passado por uma fase tão marada. Tão depressa me apetece gritar com toda a gente e mandar todos prá puta que os pariu, como dois segundos depois me apetece desatar a chorar cheia de pena de mim própria, como quatro segundos depois já estou toda bem disposta e activa. Enfim, o Alex está a conseguir conviver com a espécie de Médico e Monstro em que me tornei. Só espero que me passe antes que a pachorra do homem se acabe.
Com esta puta desta disposição, não só tenho que me esforçar por mostrar constantemente boa cara, como vão aparecendo sempre aqueles probleminhas inerentes à vida por aqui:
- Ontem ficámos sem energia eléctrica em metade da casa e até hoje ninguém sabe porquê. Os técnicos já lá foram e não percebem patavina daquela merda. Enquanto isso tenho dois frigoríficos com comida a estragar-se. Para além de não poder cozinhar - não há aparelhos a gás...
- Apareceu o cio à bulldog. Isto pode não parecer nada, mas um bulldog com SPM é a coisa mais difícil de aturar que existe (pior do que eu..). Acontece que à conta disso já há paredes (viram bem, PAREDES) roídas, vasos extirpados e a Shap Pei leva dentadas todos os dias por não se sujeitar aos apetites sexuais lésbicos da outra cadela....
- Temos, obrigatoriamente, que oferecer uma festa para 20 pessoas na sexta-feira (sem electricidade vai ser mais complicado....) o que implica uma trabalheira que é melhor não descrever aqui.
Enquanto isso tenho andado a sofrer a esquizófrenia colectiva dos nossos compatriotas: tão depressa recebo cartas de agradecimento e louvor a dizer que eu sou uma santinha, uma querida e uma simpática, como recebo cartas a dizer que humilho o pessoal e sou uma estúpida prepotente. O mais engraçado no meio disto tudo é que trato toda a gente por igual, até porque a nossa constituição diz bem preto no branco que as leis são iguais para todos. Parece que uma parte dos nossos conterrâneos se consideram acima destes pequenos pormenores, mas eu não posso dizer isto - é politicamente incorrecto - toda a gente sabe que o "cliente" tem sempre razão e que os funcionários do Estado são todos uma cambada de filhos da mãe. Por isso não há alternativa - eu caio na categoria dos filhos da mãe, logo posso ser insultada a torto e a direito (incluíndo mimos de : "parto-lhe essa tromba" e pérolas literárias do género) sem a mínima hipótese de defesa.
Mas como eu estava dizendo: falta um dia meio para entar de férias....E, se ninguém me "partir a tromba" até lá, Domingo estou em Pequim sem apelo nem agravo.

11
Ago 04
publicado por parislasvegas, às 08:19link do post | comentar
Faltam três dias para entar de férias. Como já é hábito neste tipo de situações, o meu universo entrou em loop invertido com flick flack à retagarda.

03
Ago 04
publicado por parislasvegas, às 04:35link do post | comentar
Como se não bastassem as chatices todas no escritório, o tempo aqui anda um espetáculo. Agosto está no início e as árvores já começaram a ficar com as folhas castanhas. Tenho a sensação que este ano vai começar a nevar em Setembro...Os últimos três dias têm sido passados debaixo de tempestades que mais parecem tornados de fraca potência. Há árvores arrancadas em todo o lado e partes da cidade completamente inundadas.
As cadelas começaram a destruir o jardim e os tornados completaram a tarefa. Agora temos um emaranhado de flores partidas sem ponta por onde se pegue. Os jardins aqui costumam durar dois meses, o nosso nem um mês se aguentou.
O que vale MESMO é que acabei hoje de preencher os papelitos todos para conseguir os vistos chineses. O que quer dizer que Pequim está cada vez mais perto. Os papéis só tinham versão chinesa e russa. Quem diria que eu alguma vez na vida iria conseguir preencher papéis em russo!
As viagens que já fizémos daqui para a China têm sido memoráveis:
Os únicos voos que conseguimos reservar nas férias anteriores eram aviões soviéticos de companhias falidas (ou melhor, o ÚNICO avião soviético de uma companhia oficialmente falida). Imaginem-se a viajar num TU-154, cuja maioria dos bancos nem sequer estão fixos ao chão, decoração interior anos 60, nunca remodelado ou reparado. Cheio de buracos. Passadas oito horas de suplício, parámos na Sibéria para esticar as pernas. Nunca houve terra que me parecesse tão acolhedora!!!!
As piores horas que passei dentro de um avião foram num destes voos, quando regressámos de Pequim com o velho Tupolev carregado com toneladas de contrabando. O bicho ia todo desiquilibrado, tal não era o peso. A tripulação ia feita com os passageiros, e por sua vez, TODOS estavam feitos com a alfândega. Eram só notinhas de dólar a circular de mão em mão. Uma das respeitáveis senhoras que viajava connosco passou metade do voo a encafuar jóias na roupa interior. Isto à frente de todos os passageiros porque as casas de banho são mais pequenas do que nos Boingues e a mulher andava a precisar de fazer dieta.
Desta vez conseguimos viajar num Boingue e a companhia ainda não faliu. Vamos lá ver o que nos espera. Pelo sim, pelo não, já tenho uns xanax preparadinhos para o avião. Não me posso dar ao luxo de panicar ao pé das crianças.
Com a perspectiva de Pequim a desconcentrar-me ( e a libertar-me!) dos problemas de merda do dia-a-dia, resolvi mudar as leituras. Só para me aperceber bem ONDE estou e não viajar completamente na maionese. Nos últimos seis meses andei a ler quase a 100% autores chineses ou livros sobre cultura chinesa. Agora resolvi interromper um estudo que andava a ler sobre os navegadores e a cartografia chinesa do séc.XV e regressar aos temas "locais".
Ando a ler uma biografia da Imperatriz Catarina e, ao mesmo tempo, um estudo sobre a organização social russa, desde a pré-história aos tempos da revolução. Tenho tropeçado com algumas teorias interessantes. Mas isso será tema para outra posta, se eu tiver pachorra para isso.

02
Ago 04
publicado por parislasvegas, às 03:09link do post | comentar
Este blog anda verdadeiramente desinteressante. Há inúmeras coisas que me andam a afectar a vida sobremaneira mas que, por razões de ética e obrigação profissional nunca podem ser traduzidas em palavras e muito menos colocados nas ondas cibernéticas da internet. Provavelmente este meu pudor em escancarar os problemas profissionais no blog é apenas excesso de zelo. O pequeno círculo que vem cá parar e acaba por ler uma ou duas larachas minhas sabe perfeitamente o que é que faço para ganhar dinheiro, portanto eu devia era cagar nisso e por ao peito.
A verdade é que, ao contrário de maior parte das pessoas que eu conheço, eu tenho (ou tinha, já nem sei) uma paixão avassaladora por aquilo que faço. Nunca trabalhei das 9 às 5, a fazer missa de corpo presente só para receber o meu ao fim do mês. Sempre vivi a minha profissão com todas as minhas forças, independentemente dos danos que essa atitude pudesse provocar na minha vida pessoal.
Não é que eu espere uma medalha ou que a minha foto apareça no placard de "melhor funcionário do mês". Sempre me borrifei para esse tipo de coisas. Eu gosto, eu faço e não espero nada em troca, a não ser o meu ordenado a tempo e horas (às vezes....).
Mas ultimamente tenho andado a comparar o meu trabalho àqueles casamentos por paixão fluminante. Esses raramente duram. Os noivos casam muito apaixonados, mas não se conhecem. Ao fim de um tempo, se um deles é uma grande besta e trata mal o outro, o casamento vai por água abaixo. É isso que tem acontecido no meu relacionamento com a profissão. A única coisa que eu espero em troca do meu empenhamento profissional, para além do meu ordenado é que, pelo menos, não me chamem nomes nem me ofendam pessoalmente no local de trabalho. Penso que qualquer pessoa tem direito a um tratamento "humanitário" no desempenho das suas funções.
E é assim que me venho sentindo nos últimos meses: corno, mal tratada, imerecidamente ofendida e injustamente caluniada.
O que vale é que tudo tem remédio. Quem está mal muda-se. E já não falta muito....

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