Histórias de uma portuga em movimento.
03
Mar 05
publicado por parislasvegas, às 00:49link do post | comentar
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Desde miúda que a coisa que eu gosto mais de fazer é ver coisas novas, estar fora de "casa". Isso tem-se tornado um hábito tão grande na minha vida que já perdi a noção onde está a tal "casa". Para efeitos de simplificação psicológica, gosto de pensar que a minha casa é o sítio onde está a minha família de base. Isto quer dizer que agora tenho várias casas, espalhadas por esse mundo fora, o que é muito bom, mas torna-se confuso para coisas práticas. O melhor exemplo disso foi a organizção do nosso casamento. Decidimos fazê-lo em Pequim, porque achámos que a Tailândia pós-tsunami não era propriamente sítio para festas, e porque metade dos convidados já vivia em Pequim. Assim, não precisámos de mexer os irmãos e cunhados do Xano, só precisámos de transferir o resto da família para a China. Isto implicou uma coordenação entre Lisboa, Milão, Roma e Kiev que me ia deixando doida, ainda antes de pôr o rabo em Pequim. A festanga foi das valentes, mas o que me deu mais gozo ainda, foi ter oportunidade de ver as reacções de europeus que nunca tinham estado na Ásia (penso que só a minha mãe e a minha prima, que viveu muitos anos na Ásia, faziam ideia do que iam encontrar). Também me deu muito gozo, conseguirmos reservar um hotel que é quase mítico em Pequim, o único hotel durante os anos mais duros do comunismo e um símbolo da morte da revolução cultural. O JianGuo corre o risco de ser demolido, por isso, ainda tivemos o privilégio de lá passar quase duas semanas. Foi a nossa "casa" durante grande parte do mês passado e, por mim, já lá estava outra vez.
Eu sei que as minhas queixas cibernéticas me podem fazer parecer uma tipa pessimista e que não gosta de nada que seja diferente de Portugal. Nada está mais longe da verdade. A experiência de viver num país da ex-URSS está a ser super-útil, quer em termos pessoais, quer em termos profissionais. Mas infelizmente, útil não é sinónimo de gratificante.
Quando se chega a uma cidade nova e se sabe que se tem um bilhete de avião marcado para daí a uns quinze dias, aproveita-se o mais que se pode e encontra-se sempre aspectos positivos em tudo. Em Pequim acontece-nos isso cada vez que lá vamos. Os nossos amigos que vivem lá há 10, 15 anos queixam-se imenso e nós estamos sempre a animar as hostes e a sublinhar os pontos positivos. Tantas vezes fizémos isto que o pessoal já diz que gostava que nós fossemos viver para lá. Ou nos calávamos com a porra da conversa que aquilo é tudo bom, ou conseguíamos animar o pessoal para enfrentar o dia-a-dia. Isso tem acontecido cá também. Muitas vezes somos nós que "aturamos" os nossos amigos e os tentamos animar quando eles têm problemas de adaptação.
Mas quando se chega a uma cidade nova com um bilhete de regresso para daí a 3 ou 4 anos, as coisas são ligeiramente diferentes. Os primeiros 6 meses, para mim, são um "high" desgraçado. Adoro tudo o que vejo, tento aprender tudo, instalar-me, encontrar casa, comprar móveis, etc. O resto do primeiro ano é dedicado a fazer contactos pra ver se arranjo conhecidos, eventualmente que tenham potencial para se tornarem amigos. Durante estes anos aqui, tenho tentado não pensar demasiado quando falta a carne, por exemplo. Ou quando não tenho água. Ou quando não tenho luz. Mesmo quando não tenho aquecimento no Inverno. Mas a verdade é que 3 anos disto acabam por fazer mossa. Tenho visto, pelas reacções dos outros tugas que aqui vivem, que nós até temos levado isto na boinha...Há pessoas que ao fim de três meses já estão a ficar malucas. Também não se pode ser assim. Há que resistir. Se não conseguires resistir, ignora o problema.
Estas semanas, desde o regresso de Pequim, foram especialmente díficeis.
Ficámos quase quinze dias sem água em casa. Já temos água prós banhos, mas continuamos sem água potável. Estou habituada, porque durante os dois primeiros anos não tínhamos água bebível em casa. Para cozinhar, beber e lavar os dentes, tínhamos que carregar com garrafões. Por isso, agora, é igual ao litro...
Também ainda não temos telefone, mas isso até é um descanso. Continuamos com metros de neve por todos os lados em casa, há sítios no jardim onde não se pode circular, mas pelo menos já conseguimos abrir a porta da garagem pra sair com o carro. Ao mesmo tempo, a minha situação profissional deteriorou-se significativamente. É o que acontece quando se tenta implementar um projecto novo sem ovos para fazer omeletes. Não compreendo porque é que os donos da galinha agora acham que a culpa é minha, se, afinal, os gajos é que tinham os ovos na mão, e não mos deram...
Quando tudo corre mal, sempre tento ver onde é que eu errei para poder corrigir a situação. Desta vez, por mais voltas que dê à cabeça, não consigo ver erros da minha ou da nossa parte. Tenho que chegar à conclusão que a asneira foi de nos termos voluntariado a fazer um trabalho que mais ninguém queria (e agora percebo porquê). Tenho vindo a aperceber-me que, por muitas dificuldades que passe aqui, isto já é a minha casa. Mesmo com tudo de pantanas, nesta nossa vida sem raízes, o facto de ter a noção que me falta menos de um ano para sair daqui, também me está a avariar o sistema. Vou ter saudades, isso é certo. Se conseguir sair daqui inteira, vou ter saudades - concerteza...

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