Sábado 30 de Abril, é meia-noite. Sem saber muito bem como, dou comigo num mosteiro, a uns 30 Km da cidade. O mosteiro é pequeno, branco, com um jardim tranquilo em volta, cheio de tulipas, e um pequeno cemitério medieval no centro. Estamos no meio de nada, no intervalo de ir para coisa nenhuma, à nossa direita uma colina, à nossa esquerda um pequeno riacho. Da colina só lhe vejo a sombra, do riacho apenas ouço o barulho da água a passar apressada.
Não há nenhum tipo de iluminação. Quando passo o portão da pequena propriedade, vejo dezenas de pessoas, mulheres veladas, todas cobertas, com saias compridas, alinhadas em frente ao mosteiro. À sua frente têm cestos cheios de comida. Uns maiores,outros mais pequenos,conforme as poupanças da família. Cada cesto tem, à laia de cereja no topo do bolo, uma vela acesa. Esperam. Não rezam, não falam, não se mexem. Esperam.
Decido entrar no mosteiro. A luz forte, aumentada e melhorada pelas paredes brancas cheias de ícones dourados, fere-me os olhos. Lá dentro ouve-se o Coro dos monges cantando divinamente em Eslavónico antigo. Aqui as cerimónias são quase todas cantadas, fala-se pouco. Os monges que cantam nunca aparecem, estão sempre protegidos dos olhares dos fiéis atrás dos retábulos principais da igreja. Assim sem ver a proveniência daquelas vozes, até se pode pensar que é Ele que põe anjos a cantar para nós, numa língua antiga, perdida,misteriosa.
Sinto o ar fresco a bater-me na cara. Olho em direcção ao cemitério. Cerca de seis sacerdotes ajoelham silenciosamente no centro. Os fiéis chegam,cada vez em maior número, vão se alinhando com os seus cestos. Sem que ninguém dê sinal de nada, os sacerdotes levantam-se, dirigem-se aos fiéis carneiramente alinhados. Forma-se uma fila, ou melhor, uma roda, que vai circundando o mosteiro. Três vezes. Os padres abençoam os alimentos. As voltas e as bençãos repetem-se. Decido voltar a casa.