Histórias de uma portuga em movimento.
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Nov 05
publicado por parislasvegas, às 04:40link do post | comentar

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Há um ano, estava eu a escrever isto, 50.000 pessoas já estavam na rua, e foram-se multiplicando até chegar ao meio milhão. Durante cerca de 10 dias aguentaram o frio, a neve e o desrespeito dos políticos. Acamparam no centro da cidade, gritando palavras de ordem. Criaram-se hospitais de campanha, cantinas improvisadas no meio da neve. Cada apartamento de um simpatizante se transformou em hotel provisório, era só bater às portas com autocolantes laranjas para se poder dormir umas horas ao quentinho.
Há um ano, tive uma carrinha do serviço secreto em permanência à minha porta. Os latinos estavam todos caídos na minha lareira a discutir os destinos deste país e a filosofar sobre a vida em geral. Esgotámos a reserva de vinho e de vodka. Há um ano andava eu a levantar-me às quatro da manhã para ir observar eleições.
Foi a época mais interessante que eu vivi nesta terra.
Hoje toda a gente se esqueceu. Toda a gente menos a multidão que lá esteve. Toda a gente menos os que ainda querem um país democrático, pluralista e desenvolvido. Infelizmente, para todos eles, não são 365 dias que trazem isso a uma Nação...

publicado por parislasvegas, às 03:58link do post | comentar
Desculpem lá "pôr tudo no mesmo saco", mas quando estamos fora, apercebemo-nos com mais nitidez das semelhanças e diferenças psico-sociológicas com outros povos. Para mim, tem sido bem óbvio que os espanhóis são com quem temos mais comum. Até um Castelhano é mais parecido connosco (mesmo com manias monárquicas e tiques iberistas) do que um Islandês ou um Sueco. E têm a vantagem de perceberem quando os mandamos à merda. Ou desvantagem, ainda não me decidi sobre este ponto.
De maneira que quando hoje me apercebi do ar abatido do meu colega espanhol, e dado o facto de ele vir fresquinho do nosso canto da Europa (está cá há menos de seis meses), resolvi demonstrar alguma solidariedade latina e lá fui inquirir das razões de tanta tristeza junta.
Lá veio o relambório habitual, debitado na presença da Austríaca, que fazia caretas mostrando claramente que ela não estava a processar grande parte da conversa. As queixas "standard" Ibéricas àcerca deste país são:
1- é frio pra caralhos;
2- as pessoas são esquizofrénicas - muito simpáticas na metade quente do ano, e umas bestas na metade fria;
3- a língua é de loucos. Não se consegue entender a lógica desta gramática, tão depressa pensam ao nível de crianças de 5 anos, como têm declinações tão complicadas que tornam impossível a tarefa de falar Russo a um latino.
4- o nosso trabalho é uma merda, problemas todos os dias, lidar com ameaças, insultos, burocracia kafkiana e o diabo-a-sete.
Claro que a Austríaca não estava a perceber metade, porque o país dela é igualmente frio, está habituada às mudanças de humor da população em geral, aquando da mudança de Estações, e a língua mãe dela é o Alemão que tem apenas menos uma declinação do que o Russo, por isso está aqui na maior. A única diferença é que não existem as mesmas lojas e a mesma qualidade de vida que se tem em Vienna. So What???
Reparando na cara de espanto da colega, ao ouvir o Espanhol, puxei o Jorge a um canto e comecei a dar-lhe algumas soluções para os problemas que ele me tinha referido:
1-Andar vestido como os "nativos".Em Roma sê Romano. Esquece os teus sapatinhos italianos, que não se aguentam 10 minutos neste nevão. O que é que andas a fazer de sobretudo????Vai já comprar uma daquelas samarras da Sibéria!!!
Orelhas ao léu???Tás parvo???Queres que te caiam? E enfim, para os homens, CEROULAS. Não estou a gozar, meus filhos, CEROULAS é a palavra certa.
Anatomicamente, uma das diferenças que temos é o facto de vocês possuírem bolsas exteriores, certo? Essas bolsas contém líquido, certo??? os líquidos congelam, certo???Pronto. Então. Ou vai de ceroula, ou de hospital. E já ouvi dizer que são as piores dores do mundo, que põem as dores de parto ao nível de uma ligeira dorzinha de cabeça....
2-Ao fim do segundo Inverno, deixas de notar. Ficas tão esquizofrénico como o resto, é apenas uma questão de tempo.
3- Nem tentes. Ao fim de dois, três anos sai-te tudo naturalmente. NUNCA tentes é perceber a gramática. De outra forma, nem ao fim de 10 anos vais falar Russo correctamente. O melhor é abrir os ouvidos na rua e falar sempre, mesmo quando SABES que estás a dizer um chorrilho de asneiras.
4- Nesse ponto não há nada a fazer. Junta-te aos outros otários que aceitaram vir fazer o mesmo trabalho e queixa-te uma vez por mês. Por isso mesmo é que se criaram reuniões periódicas de colegas. Quais cooperação internacional qual quê. O que a malta quer mesmo é QUEIXAR-SE.
Claro que o Espanhol fica a olhar pra mim com um ar entre o rebentar de riso e o choro iminente. Diz-me: "ok, vou tentar fazer isso tudo, mas achas que me vou conseguir habituar a isto????".
"Nem penses!Adaptar sim, claro que te vais adaptar perfeitamente. Agora habituar???Tira daí as ideias, nenhum Ibérico se habitua a viver sem luz, lamento ser eu a dar-te a notícia".
Remata o Jorge: "Exactamente o que o meu antecessor me disse, as mesmas palavras ao milímetro".
Pois é Martín, eu ainda me lembro dessa conversa que tivémos, há exactamente um ano. O povo na rua, revolução em curso, neve por todo o lado e nós em casa, de lareira acessa a comer Fois Gras e a beber Madeira, a filosofar sobre os Ibéricos e a sua "fome de luz". Coincidências....

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