Ontem fomos jantar com um amigo nosso que eu não via já há cinco anos. Primeiro porque este meu amigo esteve na Guiné-Bissau, depois porque regressou pouco tempo a Portugal e foi para Teerão, quando regressou do Irão estava eu na Ucrânia e, agora finalmente, encontramo-nos em Paris, onde ele também está a viver e trabalhar.
Juntamo-nos num restaurante Thai, altamente confortável e simpático e instalámo-nos para um jantar cedo, a dia de semana, no meio dos franciús todos que ali vão à procura de uma emoção exótica.
Passado 10 minutos de estarmos juntos já se trocavam histórias da Guiné (e não, não incluíram frases como "baratas dessssttttteee tamanho"), do Paquistão, do Irão, da China, da Tailândia e da Ucrânia.
Começámos com a risota total a relembrar os cagaços que já todos apanhámos a viajar em Tupolevs a cair de podres, o meu amigo falou dos tempos da primeira Guerra Civil da Guiné, quando o Nino foi deposto. Das tentativas de bombardeamento a um avião onde o meu amigo seguia, e de como vários passageiros acabaram a sujar as calças. Não se sabe o que será pior, o susto de passar uma situação destas, ou o cheiro dentro do avião...passámos para as nossas aventuras nos barcos a cairem de podres, nós no Mekong, o meu amigo nas águas guineenses. As viagens do nosso amigo à fronteira do Irão com o Afeganistão, onde os traficantes de ópio e heroína andam com a kalashnikov ao ombro. As festas que todos acabamos por ter em casa quando não há distrações, cinema, televisão, teatro, óperas e etc. Os doidos que se conhecem em toda a parte do mundo. Como o casal formado por um médico americano e um diplomata alemão que nós conhecemos numa ilhota perdida no Pacífico, ambos a viveram em Dunshanbé, e completamente passados da moleira.
Divertimo-nos que nem uns doidos com histórias de sítios perdidos e situações alucinantes.
O nosso amigo está em Paris há um ano. No fim do jantar, diz-nos, à laia de remate da conversa, que o nosso tempo de histórias interessantes acabou. Aqui não há nada para ver, nada para contar. Isto é uma cidade enorme, onde é difícil fazer amigos, os estrangeiros que cá estão a viver não fazem ideia do que é passar sem supermercados ou não poder ir ao cinema. Ele,que viveu durante três anos num país onde a música ocidental é proibida, não consegue achar piada a isto, tão livre e tão normal, que não existem aventuras para ser vividas.
A verdade é que já tinha pensado nisso várias vezes. Esse é o dilema do conforto. A vida torna-se bastante mais fácil, mas bastante mais chata. Por enquanto, prefiro viver assim, posso sempre viajar a sítios estranhos quando quiser "aventura". Agora ando a gostar de estar sossegada. Preocupa-me o facto de existir o perigo evidente deste blogue ficar chato, por falta de assunto ou de estímulo à imaginação. Mas penso que isso não depende de Paris, isso apenas depende de mim.