Histórias de uma portuga em movimento.
04
Abr 06
publicado por parislasvegas, às 15:41link do post | comentar | ver comentários (21)

Desculpem lá, mas ando mesmo.

Hoje, enquanto passava à frente do liceu mais fino de Paris, deparo-me com um cenário apenas possível nesta terra:

milhares de jovens, cuja mesada é o triplo do meu ordenado, enfiados em sapatinhos de 400 euros e casaquinhos de mil e muitos a protestar contra a precaridade do CPE.

Assistindo a isto tudo, com um ar de ironia, estavam uma meia-dúzia de tropas de choque. Imagino que a vontade de arrear nos meninos-bem seja difícil de controlar.Pelo menos para mim foi...

Ando facha e reaccionária sim senhor.

Na minha opinião tudo o que aqueles pipis ali estavam a fazer era chocar os paizinhos e brincar às manifestações. Eles que experimentem ir trabalhar e ganhar o ordenado mínimo e depois venham manifestar-se. Os gajos que tenham juízinho nas suas cabeças coroadas de IPods-edição-especial-chanel e ganhem alguma vergonha na cara.

Isto irrita-me porque vi ao vivo e a cores a gestação da nova geração "esquerda caviar" em França - coitadinhos dos pobres que giros que eles são, bora lá fazer uma manifestação de apoio a quem não tem emprego, coitadinhos dos não-escolarizados que nem sequer têm dinheiro para andar de griffes.

Enoja-me pá. Enoja-me a sério e faz-me ter vontade de desatar a distribuir estalo.

Quem não tem pedigree pra protestar fica em casa. Não é o que os gajos fazem nas coisas lá deles??não são só pra ricos??então? Manif. é pra descendente de proletário e mais nada!

Continuamos nesta e qualquer dia temos a "escumalha" do Jet7 a incendiar os Twingos da classe média. Ordem nesta bandalheira pá!


publicado por parislasvegas, às 09:31link do post | comentar | ver comentários (3)

E andamos outra vez nisto. Nem o governo cai, nem o pai almoça, nem a malta vai trabalhar, enfim, um belo de um impasse à maneira latina. Pelas andanças que tenho tido por esse mundo fora, ando cada vez mais convencida de que a política é uma ciência esotérica e que são necessários verdadeiros poderes sobrenaturais para perceber o que se anda a passar. É que racionalmente não vamos lá.

Não há comentário racionalizado ao que se anda a passar em França, tanto o Governo como o povo que anda nas ruas não estão a tomar atitudes racionais. O raio do contrato não me parece economicamente essencial para coisa nenhuma, poderia muito bem já ter sido retirado. E, de qualquer dos modos, o contrato não é a "Bête noire" que os sindicalistas referem, e com algumas modificações poderia passar sem mossas de maior.

O braço de ferro a que estamos a assistir na sociedade francesa está intimamente interligado com a crise generalizada que afecta todo o velho continente. Construímos um modelo social (nós não. eles todos) que é, infelizmente, demasiado pesado para se sustentar. Nem os nórdicos, cujos governantes vão a pé para o trabalho para não gastar dinheiro em carros e gasolina, estão a conseguir mantê-lo.

Já muito se tem falado, nos blogues de todos nós, da decadência do modelo social europeu do pós-guerra e das eventuais soluções para a situação. O modelo europeu está a morrer, e nós não sabemos bem como salvar o barco.

No caso francês, os trabalhadores fazem 35 horas semanais de trabalho. Estas 35 horas repercutem-se em vários sectores da sociedade: eles consomem mais, não apenas porque têm mais dinheiro disponível (o ordenado mínimo são 1.200 euros) mas também porque têm mais tempo. Muitos dias de folga são desencontrados e as horas a mais são compensadas com tempo livre. As lojas estão sempre cheias (quaisquer que sejam os preços que praticam) e os restaurantes a abarrotar.

Mesmo com as convulsões sociais dos últimos meses, se compararmos com Portugal, chegamos à conclusão inevitável que eles vivem incomparavelmente melhor do que nós.

E no entanto protestam. Protestam, porque num verdadeiro sistema democrático o povo não pode comer e calar. Porque nada do que é decidido pelos eleitos pode ser aplicado sem discussão pública. Todos os cidadãos têm consciência do que é ser cidadão, do que é ter direitos e deveres na condução dos destinos da República. O povo francês apercebe-se da morte do seu sistema e tenta agarrar-se ao que tem.

Aparentemente, nós somos os parentes pobres da Europa que, não apenas vivemos mal, mas ainda nos calamos quando nos põem a viver pior. Andamos às migalhas e ficamos satisfeitos só por manter o nosso posto de trabalho. Mas também não discutimos nada, não debatemos, reparem bem: nós nem sequer votamos.

Um país não é feito de governantes, é feito de pessoas. Mesmo depois do 25 de Abril, essa é uma lição que os portugueses ainda não aprenderam. Ou talvez, simplesmente, não estejam para se chatear.

 

 


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