Ultimamente deixei de ler. Esta afirmação é incrível pois, para mim, é a mesma coisa do que dizer "deixei de respirar". Exagero quando digo que deixei de ler, porque, na prática, estou sempre a ler qualquer coisa. Todos os dias leio todos os jornais, franceses e portugueses. Leio milhares de documentos sobre coisas interessantíssimas como os progressos da regulamentação veterinária internacional ou os projectos de expansão da rede de satélites europeia.
Acompanho obrigatoriamente toda a intriga política deste país, e os avanços e recuos da situação internacioal (aquela dos israelitas terem apanhado o senhor do Hamas em plena Ramalah vai dar merda da grossa...) e papo milhares de relatórios todas as semanas. Acho que isso me anda a tirar a paciência para me dedicar à leitura recreativa.
Mas ando a reparar que isso me tornou uma pessoa incomparavelmente mais chata. Não penso que isto seja evidente para as pessoas que me rodeiam, falo do meu mundo interior e da minha imaginação. Até os meus sonhos restringiram os temas. Agora as minhas noites são passadas como os meus dias: em reuniões e assembleias a discutir não importa o quê. Antigamente ainda conseguia dar umas voltinhas a cenários fabulosos que, seio-o agora, eram alimentados por coisas que eu lia. O meu cérebro está com falta de alimento e prega-me com chatices na hora de dormir...
O mais grave é que, mal cá cheguei, comprei dezenas de livros que continuam à espera de ser abertos pela primeira vez. Eu que não conseguia ter um livro parado na estante. Que tinha que acabar de ler qualquer coisa nos 3 dias seguintes a tê-la comprado. Isto anda a preocupar-me seriamente.
Para me curar, vou passar os próximos dias ao século XV português com a "Casa do Pó" de Fernando Campos. Para grandes males, grandes remédios....